sábado, 30 de abril de 2011

Ardendo



Em chamas. Tudo que via era vermelho. Laranja, fogo.

Queimava por dentro, num passar de segundos empoeirados.
Como no espaço, um infinito sem som. Sem sentidos.
Queimava por fora, derretia-se todo o ser.
Fumaça.
Sem vento, sem oxigênio, sem atmosfera. No Breathe.
Era isso, apenas isso. Instantes passados longos e curtos, distantes e contínuos. Paradas respiratórias por obrigação. Fim? Não tinha fim. Nem começo, ou meio. Era uma coisa só. Apenas chamas, fogo. Just fire again.
Não existia um fragmento sequer. Quanto de nada se pudesse ver.
Nada que se pudesse fazer. Apenas esperar que a chama de carne se resumisse a cinzas. Como os segundos empoeirados no Espaço desconhecido.
Nem bom nem ruim.



Não se via mais nada. Nem som, nem parte, nem começo, nem final. Apenas a escuridão.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Cavaleiro Errante

Cavaleiro errante, por entre as ideias permeando

Vai passando, desfazendo, agrupando.

Cavaleiro sem cavalo ou cela

Errante sem donzela bela.

Em natura vai brilhando,

Entre os bosques de lamúria retumbando.

Vai buscando no presente o futuro adiantado

Errante cavaleiro iluminado.

Vai tecendo entre as teias seus enlaços,

Caminhando com palavras, pés descalços.

Transportando seu saber de outros mundos

Em dois olhos de magia, poços fundos.



15 de abril de 2011

Para Pedro Semente.
Já eras minha antes de ser tua. Mas fui, sem pressa. E antes de te perceber, estavas tomada.
Ironia minha que flui de meus lábios como perfume.
Perfume ácido, sarcástico, perfume insípido, incolor.
De velhos tempos recriada, transmutada.
De noites alvas turvas. Lembranças de memórias repetidas. Trechos perdidos no escuro.
Fins de céu, de estrelas.
Não chega discreta. Não mostra secreta, nem andas ereta.

Estavas lá como um presente, a quem não se dá: se estende.
Sinuosa ironia doce.
Como água amarga, fel. Pautada de sorrisos singularizados.
De formas indomadas, sem gosto, sem sal.
E não és nem chave nem fechadura. Nem cadeado nem portão.
És ponte, passagem, atalho, desvio. És pretexto, escapatória, escapulário.
Parte que se excede sem demora, sem vista. Pretensiosa, presente. Invariavelmente descrente. Transitória de estado. Uma epopéia sem Hulisses, sem Vasco da gama. Só em essência.
E não és nada, só as falas amargas de um tempo sem beneficiários. És produto e criação. És tu e ponto.
Fim.
Já não eras mais nada.

segunda-feira, 25 de abril de 2011

Estavamos flutuando junto a multidão. Rumo a um tal infinito que no entanto, poderia ter seu fim.
Estavamos perdidos, embebidos pelo mundo, embriagados de sonhos, sentindo a música que pulsava nos corações da nação.
Não éramos nós mesmo e estávamos perdidos dentro das almas que habitavam os corpos que chamamos de nossos.
No final somos apenas isso. Almas perdidas procurando seu Norte


Inspiração, aquilo que não se pode conter.

Inspiração, momentânea que passa.

Inspiração eterna, de se ter o ser

De se ser dentro de si o sempre.


Fugaz, fugitiva, figurante

Fogo que foge por entre os dedos

Água que corre, perene, atrativa


Um beijo, uma cena, palavra
Fato ideia, mensagem incerta


Conversa de fim de tarde

Céu azul de outono

Vento gelado na face quente corada


Areia nos pés

Árido de sol

Inspiração de vida


Inspiração. Expiração. Afflatus.

segunda-feira, 18 de abril de 2011

sábado, 16 de abril de 2011

"Oh, someday I know someone will look into my eyes
and say: hello, you're my very special one
but if you close the door, I'd never have to see the day again."

After Hours - The Velvet Underground

quinta-feira, 14 de abril de 2011

"E se me achar esquisita, respeite também.
Até eu fui obrigada a me respeitar." - Clarice Lispector

Com o passar do tempo a gente entende, que já não são as qualidades que importam, nem mais os defeitos, mas sim o contexto todo, a forma como se reage com o mundo. A forma como se vive o mundo e dele se cria.

terça-feira, 12 de abril de 2011

Alma minha gentil, que te partiste

"Alma minha gentil, que te partiste
Tão cedo desta vida, descontente,
Repousa lá no Céu eternamente
E viva eu cá na terra sempre triste.

Se lá no assento etéreo, onde subiste,
Memória desta vida se consente,
Não te esqueças daquele amor ardente
Que já nos olhos meus tão puro viste.

E se vires que pode merecer-te
Alguma cousa a dor que me ficou
Da mágoa, sem remédio, de perder-te,

Roga a Deus, que teus anos encurtou,
Que tão cedo de cá me leve a ver-te,
Quão cedo de meus olhos te levou."

Luís de Camões
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domingo, 3 de abril de 2011

Vejo minha vida por inteiro e é como se visse a chuva de fora. E ao mesmo tempo, como se ela corresse dentro de mim. Não sinto vontade de chorar, por que, no fundo, as grossas gotas choram por mim. E essa chuva material que deságua, me acolhe. Me guarda como uma semelhante. Como uma irmã. E não entendo ao certo o que significa tudo isso. Só deixo correr. Como a chuva passando pelas calçadas. Bueiros.
[E lhe disse: "De todas maneiras, tenho que sair daqui para acordar".

Lá fora o vento bateu um instante, ficou quieto depois, e ouviu-se a respiração de alguém adormecido que acabava de virar-se na cama. O vento do campo suspendeu-se. Já não houve mais odores. "Amanhã vou reconhecer você por isso", disse. "Vou reconhecê-la quando vir na rua uma mulher que escreva nas paredes: 'Olhos de cão azul'". E ela, com um sorriso triste — que já era um sorriso de entrega ao impossível, ao inatingível —, disse: "Não obstante, você não lembrará nada durante o dia". E voltou a pôr as mãos sobre o abajur, com a expressão obscurecida por uma névoa amarga: "Você é o único homem que, ao acordar, não se lembra nada do que sonhou".] - Olhos de Cão Azul - Gabriel Garía Márquez