sábado, 12 de novembro de 2011

- Não sei se quero dar seguimento a esse livro louco. Ele pertence a esse mundo louco, vem de gente louca, gente alucinada e incompreendida.
A luz apagou na cozinha. Veio em passos ruidosos, meio abafados, com os pés descalços. Os cachos soltos se amaranhavam naquilo que ela chamava de cabelo. Dois copos na mão.
- Você sempre quer parar de escrever esse livro, mas nunca para. Talvez realmente devesse parar.
Entregou o copo ao homem encostado em seu sofá.
- Você não entende nada do que eu digo. Não quero parar, disse que não sei se quero seguir.
- E não seguir não é a mesma coisa que parar?
- Não. Parar é bem diferente. Parar é brusco, parar é um fim.
- Não seguir também. - Ainda encostado, cruzou os braços, com certo ar de quem sabe das coisas.
- Não! Não seguir é uma pausa. É um simples intervalo temporal. - Com seus jeans desbotados, entregou uma das taças de líquido ignorado que segurava nas mãos morenas a ele.
- Você fala como se realmente soubesse sobre o tempo.
- Com certeza sei mais que você.
- Sabe mesmo, e eu sei que sabe.
Eles riram. Era bom rir junto.
Foi até a janela, abriu. Parou no parapeito e ficou olhando a paisagem daquele apartamento no 15º andar.
Tudo parecia tão longe.
- O que é que você tem heim?
- Não sei, acho que é falta de estrela. Nunca tem estrela nessa cidade cinza. É por isso que eu sou louca. E você também.
- Eu não sou louco. Quem é louca é você, falando aqui com alguém que você criou.
- Eu criei você?
- Criou. No auge da sua imaginação.
- Ah...
- Que foi?
- Achei que você é quem tinha se criado. Dentro da minha cabeça, é claro. Mas achei que você já existia, antes de eu saber da sua existência.
- Eu sei.
Silêncio.
- Olha! Tem uma estrela ali!
- Onde? Cadê?
- Ali olha, bem ali! - Disse ela com o dedo em riste, apontando um pontinho brilhante no céu escuro
- Não é estrela não.. Será?
- É sim, olha! Olha ali, bem ali. Tá brilhando!
- Nem tudo que reluz é ouro.
- Eu disse estrela.
- Tá certo. Mas não sei se é não.
- Tô dizendo que é! Olha, faz tanto tempo que eu não vejo estrela que até..
A estrela começou a ficar maior. E luzes coloridas piscavam juntamente com  o brilho branco.
- Mas que... Ah, não é estrela não.
- É só um avião meu bem.
O avião-estrela passou. Cruzou o céu ao longo de sua face profunda e vincada.
- É só um avião, como todas as outras coisas são só o que são. Vai, bebe que passa.

Nenhum comentário:

Postar um comentário